sábado, 27 de setembro de 2008

Eu até simpatizei toda a vida com a rosa... "L'important c'est la rose..." pensava eu...

Foto: Rosa Desfocada e Descaída.

Há Artigos de Opinião que merecem ser lidos, , para dar que pensar, para repensar, para não deixarmos de pensar...



"Baptista Bastos : O Ranço Salazarista
Cada vez mais nos afastamos uns dos outros. Trespassamo-nos sem nos ver.Caminhamos nas ruas com a apática indiferença de sequer sabermos quem somos.Nem interessados estamos em o saber. Os dias deixaram de ser a aventura doimprevisto e a magia do improviso para se transformarem na amarga rotina doviver português e do existir em Portugal.Deixámos cair a cultura da revolta. Não falamos de nós. Enredamo-nos nafutilidade das coisas inúteis, como se fossem o atordoamento ou o sedativodas nossas dores. E as nossas dores não são, apenas, d'alma: são, também,dores físicas.Lemos os jornais e não acreditamos. Lemos, é como quem diz - os que lêem. Astelevisões são a vergonha do pensamento. Os comentadores tocam pela mesmapauta e sopram a mesma música. Há longos anos que a análise dos nossosproblemas está entregue a pessoas que não suscitam inquietação em quem osouve. Uma anestesia geral parece ter sido adicionada ao corpo da nação.Um amigo meu, professor em Lille, envia-me um email. Há muitos anos, deixouPortugal. Esteve, agora, por aqui. Lança-me um apelo veemente e dorido: 'Quese passa com a nossa terra? Parece um país morto. A garra portuguesa foiaparada ou cortada por uma clique, espalhada por todos os sectores da vidanacional e que de tudo tomou conta. Indignem-se em massa, como dizia oSoares.'Nunca é de mais repetir o drama que se abateu sobre a maioria. Enquanto doismilhões de miúdos vivem na miséria, os bancos obtiveram lucros de 7,9milhões por dia. Há qualquer coisa de podre e de inquietantemente injustonestes números. Dir-se-á que não há relação de causa e efeito. Há, claro quehá. Qualquer economista sério encontrará associações entre os abismos dapobreza e da fome e os cumes ostensivos das riquezas adquiridas muitas vezesnão se sabe como.Prepara-se (preparam os 'socialistas modernos' de Sócrates) a privatizaçãode quase tudo, especialmente da saúde, o mais rendível. E oprimeiro-ministro, naquela despudorada 'entrevista' à SIC, declama que estáa defender o SNS! O desemprego atinge picos elevadíssimos. Sócrates dizexactamente o contrário. A mentira constitui, hoje, um desportoparticularmente requintado. É impossível ver qualquer membro deste Governosem ser assaltado por uma repugnância visceral. O carácter desta gente éinexistente. Nenhum deles vai aos jornais, às Televisões e às Rádios falarverdade, contar a evidência. E a evidência é a fome, a miséria, a tristezado nosso amargo viver; os nossos velhos a morrer nos jardins, com reformasde não chegam para comer quanto mais para adquirir remédios; os nossosjovens a tentar a sorte no estrangeiro, ou a desafiar a morte nas drogas; ailiteracia, a ignorância, o túnel negro sem fim.Diz-se que, nas próximas eleições, este agrupamento voltará a ganhar. Diz-seque a alternativa é pior. Diz-se que estamos desgraçados. Diz um general querecebe pressões constantes para encabeçar um movimento de indignação. Diz-seque, um dia destes, rebenta uma explosão social com imprevisíveisconsequências. Diz a SEDES, com alguns anos de atraso, como, aliás, é seutimbre, que a crise é muito má. Diz-se, diz-se.Bem gostaríamos de saber o que dizem Mário Soares, António Arnaut, ManuelAlegre, Ana Gomes, Ferro Rodrigues (não sei quem mais, porque socialistas,socialistas, poucos há) acerca deste descalabro. Não é só dizer: é fazer, éagir. O facto, meramente circunstancial, de este PS ter conquistado amaioria absoluta não legitima as atrocidades governamentais, que sobem emescalada. O paliativo da substituição do sinistro Correia de Campos peladr.ª Ana Jorge não passa de isso mesmo: paliativo. Apenas para toldar osolhos de quem ainda deseja ver, porque há outros que não vêem porque nãoquerem.A aceitação acrítica das decisões governamentais está coligada com acumplicidade. Quando Vieira da Silva expõe um ar compungido, perante osrelatórios internacionais sobre a miséria portuguesa, alguém lhe devia dizerpara ter vergonha. Não se resolve este magno problema com a distribuição deumas migalhas, que possuem sempre o aspecto da caridadezinha fascista. Umsocialista a sério jamais procedia daquele modo. E há soluções adequadas. Oacréscimo do desemprego está na base deste atroz retrocesso.Vivemos num país que já nada tem a ver com o País de Abril. Aliás, penso,seriamente, que pouco tem a ver com a democracia. O quero, posso e mando deJosé Sócrates, o estilo hirto e autoritário, moldado em Cavaco, significaque nem tudo foi extirpado do que de pior existe nos políticos portugueses.Há um ranço salazarista nesta gente. E, com a passagem dos dias, cada vezmais se me acentua a ideia de que a saída só reside na cultura da revolta. "

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